07 outubro 2008

Livros escritos no celular viram best-sellers


Rin vendeu 400 mil cópias de seu livro, escrito completamente no celular

Norimitsu Onishi

Até recentemente, os romances publicados em celulares - compostos em teclados de telefones por mulheres jovens dotadas de dedões muito ágeis e lidos por fãs nas minúsculas telas de seus aparelhos - não eram muito respeitados no Japão, que os considerava como uma espécie de subgênero literário em um país que deu ao mundo o primeiro romance, "A História de Genji", um milênio atrás. Mas no mês passado as listas de best sellers de final de ano demonstraram que romances escritos para celulares e publicados em forma de livro haviam não só encontrado espaço no mercado de literatura como pareciam dominá-lo.
Dos 10 livros mais vendidos no país em 2007, cinco foram escritos originalmente para celulares - em geral histórias de amor redigidas nas sentenças curtas que caracterizam as mensagens de texto e contendo pouco de semelhante ao desenvolvimento de trama e personagens encontrados nos romances convencionais. Além disso, os três primeiros postos da lista foram ocupados por romancistas estreantes, o que suscitou debates na mídia e nos blogs do país.

"Será que os romances de celular matarão 'o escritor'?", perguntava a famosa revista literária "Bungaku-kai", na capa de sua edição de janeiro. Os fãs consideram que os romances de celular são um novo gênero literário, consumido por uma geração cujos hábitos de leitura se formaram basicamente com os mangás, ou quadrinhos. Os críticos dizem que o domínio dos romances de celular sobre o mercado apressará o declínio da literatura japonesa, devido à sua baixa qualidade literária.
Quaisquer que sejam seus talentos literários, as romancistas que usam o celular como mídia estão registrando as vendas que escritores mais convencionais sonham conter.
Uma dessas estrelas, Rin, 21 anos, escreveu "Se Você" em seis meses, durante seu último ano no segundo grau. Escrevendo no trem a caminho de seu emprego de tempo parcial ou durante qualquer momento livre, Rin digitava o texto em seu celular e depois o subia a um site de aspirantes à literatura.
Depois que seu romance foi escolhido pelos leitores como o melhor trabalho em seu segmento, a história de amor trágico entre dois amigos de infância que ela escreveu foi lançada em forma de livro, com 142 páginas, no ano passado. As vendas chegaram a 400 mil cópias, o que faz de seu romance o quinto mais vendido em 2007, de acordo com uma lista da Tohan, grande distribuidora de livros, que serve como referência ao mercado.

"Nem minha mãe sabia que eu estava escrevendo um romance", disse Rin, que como muitos dos autores de romances para celulares, usa só um nome. "Quando contei a ela que publicaria um romance, ela se espantou". "Só acreditou quando viu o livro nas lojas", acrescenta.

O gênero surgiu em um 2000, quando um site que ensina a construir home pages chamado Maho no i-rando percebeu que muitos usuários estavam escrevendo romances em seus blogs; o site alterou seu software para permitir que os usuários subissem trabalhos em andamento, e criou o romance em folhetim para celulares. Mas o número de escritores do gênero só disparou dois ou três anos atrás, e o site informa que, no mês passado, o número de histórias que ele hospeda subiu a um milhão.

O boom parece ter sido alimentado por um desdobramento que não se relaciona à cultura ou à literatura, e sim à decisão das operadoras de telefonia móvel japonesas de permitir transmissão ilimitada de pacotes de dados, como mensagens de texto, como parte da tarifa mensal única. A DoCoMo, a maior delas, passou a oferecer esse recurso em 2004.

Isso coincidiu com o amadurecimento de uma geração de japoneses para quem o celular se tornou o eletrônico mais importante, superando o computador. Eles optaram por ler romances em seus celulares ainda que os mesmos títulos estivessem disponíveis na Web. Os comentários sobre os textos são digitados em velocidade alucinante com o uso dos dedões, e expressões e emoticons incompreensíveis para pessoas de mais de 25 anos formam o dialeto desse grupo.

The New York Times

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